Inteligência artificial, Chat GPT e suas repercussões na saúde física e mental. Por Kerlon Lira, Fisioterapeuta especialista em coluna.
O mundo (ou seria “metamundo”?) está substancialmente mais conectado. A pandemia do novo coronavírus, já arrefecida graças aos avanços na vacinação em boa parte do mundo, acelerou a transformação digital que era prevista apenas para um futuro próximo. De e-comerce à consultas on-line, tudo ficou a apenas um clique de distância. O que antes era um hobby, para muitos passou a ser ferramenta de trabalho, tornando o smartphone e as redes sociais os grandes protagonistas no rendimento de grande parte das pessoas, mas principalmente das organizações, como demonstra estudo do International Data Corporation (IDC), que traz um índice de 62,8% das organizações brasileiras empregando um modelo de trabalho dinâmico e reconfigurável; 52,4% conectando organizações e indivíduos, independentemente de sua localização; 40% estão garantindo resiliência na infraestrutura digital e 38,7% trabalhando em prol de mais credibilidade e confiança junto ao cliente.
No âmbito da educação, um outro estudo, feito pelo Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente da Universidade Federal de Minas Gerais (Gestrado/UFMG) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), apontou que houve aumento significativo de horas trabalhadas por parte dos professores, nas chamadas aulas on-line, com motivação e engajamento dos alunos bem abaixo quando comparado com o regime presencial. Além disso, a saúde mental dos envolvidos foi avaliada, com quase 70% revelando medo e ansiedade com as perspectivas futuras em relação ao “retorno à normalidade”.
A pandemia do novo coronavírus não afetou apenas as pessoas que foram contaminadas pela COVID 19. Milhões de pessoas no mundo, ao se isolarem socialmente, foram acometidas por mais ansiedade, mais medo, mais depressão e menos movimento. Uma receita que ajudou, dentre outras coisas, a amplificar sintomas de dor nas costas.
Já parou pra pensar que uma simples dor na coluna pode ser responsável por impedi-lo de viajar, ir a uma festa, brincar com seu filho? Já passou por isso?
A dor nas costas afetará mais de 85% das pessoas no mundo. No Brasil, milhões de pessoas convivem com a dor crônica e vivem, de tempos em tempos, a situação descrita acima com certa frequência e sem muitas perspectivas. Pessoas com dor crônica que, por causa de situações que podem variar de um estresse a um movimento feito de maneira brusca, agudizam a sua dor e se limitam a realizar as atividades do dia a dia com fluidez. A dor faz isso!
E o que a inteligência artificial (IA), o tal do Chat gpt-4, nova aposta dos gigantes da tecnologia, tem a ver com isso? Como a IA vai influenciar na nossa saúde física e mental? Na minha opinião, da mesma maneira que já vem acontecendo, só que de uma forma muito mais amplificada.
Para contextualizar você, leitor que acabou de chegar, Inteligência Artificial (IA) é uma área da tecnologia que busca criar computadores e programas capazes de realizar tarefas que normalmente exigem inteligência humana, como entender o que uma pessoa diz ou reconhecer objetos em uma imagem. O Chat GPT (Generative Pre-trained Transformer), que ficou famoso nos últimos dias, é um tipo de programa de computador que usa a inteligência artificial para gerar respostas a partir de textos que lhe são fornecidos. Ele foi criado para entender e responder de forma natural a perguntas e comandos feitos por humanos, como um assistente virtual ou um chatbot.
Não precisamos ser experts em tecnologia para saber o que acontecerá no futuro com a saúde física e mental das próximas gerações que, cada vez mais imersas na realidade virtual, deixarão de lado o que temos de mais primitivo no corpo humano: o movimento. Essa nova era da tecnologia, que certamente receberá o mesmo peso da era em que a internet “ganhou vida” e mudará os rumos de várias profissões nos próximos anos, também será responsável pelo aumento de doenças crônico-degenerativas.
Sem movimente e cada vez mais imersos em um ambiente virtual, horas à fio, aumentarão sobremaneira a incidência de obesidade, sedentarismo, ansiedade, depressão e, consequentemente, dor crônica, tanto pelo contexto, quanto pela inércia. Utilizando apenas duas das condições supracitadas como exemplo, sedentarismo e obesidade, Stone e colaboradores (2020), em artigo publicado na revista Obesity and Pain Are Associated in the United States, observaram que o índice de massa corporal variando entre 30 e 40+ está associado a aumento de incidência de dor crônica variando entre 68% e 254%, respectivamente. Já a ansiedade, sabidamente prejudicada pelos excessos de uso da internet, sobretudo em redes sociais, possui relação direta com a cronificação da dor à luz da ciência. O estudo de Hallegraef e colaboradores (2020) concluiu que quanto maior a ansiedade, maior a cronificação da dor em pacientes com dor lombar aguda.
E para finalizar, ressaltando a importância do movimento para a saúde, observem o resultado deste grande e relevante estudo realizado por Zhoa e colaboradores (2020) que avaliou, pasmem, 479.856 indivíduos, investigando a associação entre atividade física e causas de mortalidade. As principais doenças avaliadas foram doenças cardiovasculares, câncer, diabetes, doenças respiratórias crônicas, influenza e pneumonia, doenças renais, e Alzeheimer. E a chave para viver mais e melhor está no exercício. Tanto exercícios aeróbicos como de fortalecimento diminuíram a causa de mortalidade em determinadas doenças, entretanto quando combinadas, a taxa de mortalidade diminuiu em TODAS as doenças pesquisadas!
Por que o movimento corporal ativo, feito de forma sistemática, melhora nosso estado geral de saúde, além de proporcionar alívio da dor de pacientes crônicos?
Primeiro entenda que nosso corpo é um grande hardware que recebe estímulos da periferia e os leva ao nosso cérebro (sistema nervoso central), que é o nosso centro. Entenda também que para todo input (entrada de estímulo) existe um output (resposta a esse estímulo). Existem dois tipos de resposta que nossa central envia em pacientes com dor persistente: hiperalgesia (uma região mais dolorosa) e analgesia. Analgesia é uma resposta que inibe a dor. Pacientes com dor crônica possuem alteração principalmente na resposta de inibição. O seu sistema está desregulado e o paciente sente dores frequentes aos pequenos esforços. O que o exercício físico faz é restaurar esse padrão de resposta. Chamamos de “analgesia induzida pelo movimento”. O movimento corporal ativo, feito de forma sistemática, todos os dias, por alguns meses, tem capacidade de melhorar nosso cérebro para uma resposta de inibição de dor mais eficaz.
Por isso insisto tanto na história do #movimentoeachave e #keepmoving.
Nosso corpo é uma máquina. A maioria das pessoas está com essa máquina sem funcionar corretamente há muito tempo. Quem ativa essa máquina é o movimento.
Evite, portanto, passar muito tempo parado, sentado, em posturas prolongadas, seja em casa, no seu local físico de trabalho ou no metaverso. Blaise Pascal, matemático, escritor e filósofo francês, entusiasta das ciências naturais, lá no século XVII, disse uma frase que sempre carrego comigo: “A nossa natureza está no movimento, o repouso completo é a morte”.
Não podemos fugir dos avanços tecnológicos, mas podemos ser mais conscientes no seu uso. Se a tendência da humanidade beira a inércia e sedentarismo, façamos o movimento oposto.
Movimente-se mais, durante todo o dia e faça exercícios reais, no mundo real.
A vida pede movimento.